Pier Giorgio Frassati e a profecia do leigo.

Casa de Pollone -Italia
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Giovanni Trovati

 

Na vida de Pier Giorgio Frassati podemos ver três momentos coligados pela dedicação ao próximo. A amizade pelos pobres “de meios” é o que mais se realça. Rico de família, mas pessoalmente com dinheiro limitado, porque em casa eram muito parcimoniosos, visitava as famílias que sabia estarem em condições de necessidade e dava o que tinha e mais, economizando até na passagem do ônibus ou pedindo emprestado aos amigos. Mais do que doar, se doava, para cumprir uma obra de evangelização, da qual naturalmente saia evangelizado.

A fé impõe amar a Deus, amar Deus implica que “seja feita a Sua vontade”, e esta nos remete a repartir com os outros. Por sua vez, o amor pelo próximo predispõe o ânimo a compreender o mistério da fé. É um círculo que envolve o eu, Deus, os outros. Não se vive sozinho e não nos salvamos sozinhos.

Um segundo momento da vida de Pier Giorgio Frassati, consequência do primeiro, é o propósito de trabalhar na Alsacia, uma vez conseguido o diploma de engenharia, para estar com os alemães que tinham ficado sob o jugo da França após a primeira guerra mundial e que sofriam na condição de vencidos. Também esses considerava pobres. Para testemunhar sua participação, estava pronto a deixar todo privilégio na Itália. O pai pretendia prepará-lo para a sucessão no comando do “La Stampa”: teria conseguido o lugar seguramente, de grande prestígio e remuneração e a carreira fácil que o teria colocado entre aqueles que contavam e formavam opinião. Se suas visitas às famílias necessitadas lhe traziam incompreensão, a notícia de ir trabalhar ao Deus dará, fora da pátria, ao lado daqueles que sofriam uma injustiça, o colocou em confronto com os pais. Fazer o bem sempre tem um pedaço de sofrimento e ele estava convencido que quem vê o bem e o renuncia é um desertor.

O terceiro momento, que pretendo realçar, é político. Se posicionou contra o fascismo em sua formação e sua afirmação, porque o considerava uma ofensa à religião e à dignidade humana. E se rebelou sempre, publicamente, aos gestos de obsequio que vinham também de setores católicos. Via no fascismo o abuso, e coerentemente se posicionava com aqueles que eram privados da liberdade: também esses eram pobres.

Pier Giorgio Frassati era o leigo que acompanhava o sacerdote onde o sacerdote é presente e penetra lá onde o sacerdote é ausente. “Em tantas famílias, em tantos lugares de trabalho, apenas o leigo pode acender o fogo que Cristo trouxe sobre a Terra” afirmou padre Carré após a grande prova do ultimo conflito numa pregação quaresmal em Notre Dame. Para dar testemunho do Evangelho são necessárias a santidade interior e o culto sacramental. O jovem Frassati se preocupava com uma e outro. Se dá o que se tem, e se tem o que através da oração se obtém de Deus.

Amava os pobres, ajudava-os na promoção humana impulsionado pela carga revolucionária da caridade. Muda-se o mundo mudando-se o homem: a revolução que impõe novas estruturas através da violência opera uma mudança ilusória que leva sempre à ditadura, à opressão. Sempre foi assim no passar dos séculos, assim constatamos com a revolução de outubro.

O cristão é um revolucionário porque quer mudar o mundo começando pelo seu próximo: obra cansativa, difícil, de êxito imprevisível. Escrevia padre Guardini mais ou menos ao mesmo tempo que Pier Giorgio: “O que pode convencer o homem moderno não é um cristianismo histórico ou psíquico, mesmo que modernizado, mas apenas a mensagem plena, total, não partida, da revelação”. O Vaticano II quarenta anos depois relacionou a vocação e a missão do leigo com a vocação e a missão da Igreja.” Esse povo – lê-se na Lumen Gentium – tem por lei o preceito de amar como o próprio Cristo nos amou”. Ou seja, sem medida. Ao amor se dá o máximo. A semente de memória evangélica morre para dar fruto e morre sob a terra, escondida, porque o bem feito para ser conhecido traz em si a grande limitação de não ser desinteressado. Uma definição do professor Lazzati nos ajuda a entender quem é o leigo: é um homem batizado que participa da vocação geral que pertence a todos, a santidade. A santidade pressupõe uma busca continua de Deus na humanidade.

Assim se compreende o conceito de caridade que São Paulo exalta como primeira virtude: significa participar da vida do outros, nos muitos sofrimentos e nas poucas alegrias. O leigo toma nas mãos sua própria existência e a dos outros, no colóquio continuo com o autor da vida e na imersão no mundo. É a testemunha de uma difícil fé e com sua obra pode colocar em crise benéfica aos outros. Padre Congar escreveu que é um homem que sabe que o mundo existe. Frase que sinteticamente resume o que afirmava o autor desconhecido da Carta a Diogneto nos alvores do cristianismo: “Os cristãos não podem se separar da sociedade devido à universalidade da fé que professam, mas também não se identificam com ela. Sua função consiste em inserir-se na história dos homens, em respeitá-la, em colher dela o que é positivo, no ser fermento ativo, conscientes que também os valores seculares, para darem frutos, devem passar pela cruz”.

Pier Giorgio Frassati experimentou o quanto custa carregar a cruz, em cansaço e em escárnio – porque a cruz continua a ser bobagem para o mundo – mas foi consciente que a verdadeira alegria vem do compreender e auxiliar os outros. Sua vida nos aparece como um sofrimento glorioso, próprio do santos.

Turim, 21 de setembro de 1988

* Giovanni Trovati foi vice diretor e jornalista do La Stampa.

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