HOMILIA DO PAPA LEÃO XIV

Praça de São Pedro
XXIII Domingo do Tempo Comum, 7 de setembro de 2025

Bom dia a todos! Feliz domingo e bem-vindos! Obrigado!

Irmãos e irmãs, hoje é um dia de grande festa para toda a Itália, para toda a Igreja, para todo o mundo!

Antes de começar a solene celebração da canonização, gostaria de saudar e dizer algumas palavras a todos vós, porque, se por um lado a celebração é muito solene, por outro é também um dia de grande alegria!

Gostaria de saudar especialmente os muitos jovens e adolescentes que vieram para esta Santa Missa! É realmente uma bênção do Senhor: encontrarmo-nos juntos com todos vocês que vieram de diferentes países. É realmente um dom da fé que queremos partilhar.

Após a Santa Missa, se puderem ter um pouco de paciência, espero poder ir até a praça para cumprimentá-los. Então, se agora vocês estão longe, esperamos pelo menos poder nos cumprimentar…

Saúdo os familiares dos dois Beatos quase Santos, as delegações oficiais, tantos Bispos e sacerdotes que vieram. Um aplauso para todos eles! Obrigado também a vocês por estarem aqui, religiosos, religiosas e a Ação Católica!

Preparemo-nos para esta celebração litúrgica com a oração, com o coração aberto, desejando receber verdadeiramente esta graça do Senhor. E sintamos todos no coração o mesmo que Pier Giorgio e Carlo viveram: este amor por Jesus Cristo, sobretudo na Eucaristia, mas também nos pobres, nos irmãos e nas irmãs. Todos vós, todos nós, somos chamados a ser santos. Deus vos abençoe! Boa celebração! Obrigado por estarem aqui!

* * *

Queridos irmãos e irmãs,

na primeira leitura, ouvimos uma pergunta: «[Senhor,] quem conhecerá a tua vontade, se não lhe deres a sabedoria, e não enviares o teu santo espírito lá do céu?» (Sb 9,17). Ouvimos essa pergunta depois que dois jovens beatos, Pier Giorgio Frassati e Carlo Acutis, foram proclamados santos, e isso é providencial. Com efeito, no Livro da Sabedoria, essa pergunta é atribuída justamente a um jovem como eles: o rei Salomão. Ele, com a morte de Davi, seu pai, percebeu que tinha muitas coisas: poder, riqueza, saúde, juventude, beleza e realeza. Mas justamente essa grande abundância de meios fez surgir em seu coração uma outra pergunta: “O que devo fazer para que nada disso se perca?”. E compreendeu que a única maneira de encontrar uma resposta era pedir a Deus um dom ainda maior: a sua Sabedoria, para conhecer os seus projetos e aderir fielmente a eles. Na verdade, ele percebeu que só assim tudo encontraria o seu lugar no grande desígnio do Senhor. Sim, porque o maior risco da vida é desperdiçá-la fora do projeto de Deus.

Também Jesus, no Evangelho, fala-nos de um projeto ao qual devemos aderir totalmente. Ele diz: «Quem não tomar a sua cruz para me seguir não pode ser meu discípulo» (Lc 14, 27); e ainda: «Qualquer de vós, que não renunciar a tudo o que possui, não pode ser meu discípulo» (v. 33). Assim, convida-nos a aderir sem hesitação à aventura que Ele nos propõe, com a inteligência e a força que vêm do seu Espírito e que podemos acolher na medida em que nos despojamos de nós mesmos, das coisas e ideias às quais estamos apegados, para nos colocarmos à escuta da sua palavra.

Muitos jovens, ao longo dos séculos, tiveram de enfrentar esta encruzilhada na vida. Pensemos em São Francisco de Assis: tal como Salomão, também ele era jovem e rico, sedento de glória e fama. Por isso partiu para a guerra, na esperança de ser nomeado “cavaleiro” e cobrir-se de honras. Mas Jesus apareceu-lhe ao longo do caminho e fez-lhe refletir sobre o que estava a fazer. Recuperando a lucidez, dirigiu a Deus uma pergunta simples: «Senhor, o que queres que eu faça?». [1] E a partir daí, voltando atrás, começou a escrever uma história diferente: a maravilhosa história de santidade que todos conhecemos, despojando-se de tudo para seguir o Senhor (cf. Lc 14, 33), vivendo na pobreza e preferindo o amor pelos irmãos, especialmente os mais fracos e os mais pequenos, ao ouro, à prata e aos tecidos preciosos do seu pai.

E quantos outros santos e santas poderíamos recordar! Às vezes, nós os retratamos como grandes personagens, esquecendo que tudo começou para eles quando, ainda jovens, responderam “sim” a Deus e se entregaram totalmente a Ele, sem guardar nada para si mesmos. Santo Agostinho conta, a este respeito, que, no «nó tão complicado e emaranhado» da sua vida, uma voz, no seu íntimo, lhe dizia: «Eu quero a ti». [2] E assim Deus deu-lhe uma nova direção, um novo caminho, uma nova lógica, em que nada da sua existência se perdeu.

Neste contexto, hoje olhamos para São Pier Giorgio Frassati e São Carlo Acutis: um jovem do início do século XX e um adolescente dos nossos dias, ambos apaixonados por Jesus e prontos a dar tudo por Ele.

Pier Giorgio encontrou o Senhor através da escola e dos grupos eclesiais – a Ação Católica, as Conferências Vicentinas, a FUCI, a Ordem Terceira Dominicana – e testemunhou-O com a sua alegria de viver e de ser cristão na oração, na amizade, na caridade. A tal ponto que, ao vê-lo circular pelas ruas de Turim com carrinhos cheios de ajuda para os pobres, os amigos o rebatizaram de “Empresa de Transportes Frassati”! Ainda hoje, a vida de Pier Giorgio representa uma luz para a espiritualidade leiga. Para ele, a fé não era uma devoção privada: impulsionado pela força do Evangelho e pela pertença a associações eclesiais, comprometeu-se generosamente na sociedade, deu o seu contributo à vida política, dedicou-se com ardor ao serviço dos pobres.

Carlo, por sua vez, encontrou Jesus na família, graças aos seus pais, Andrea e Antonia – presentes aqui hoje com os dois irmãos, Francesca e Michele –, depois também na escola, e sobretudo nos sacramentos, celebrados na comunidade paroquial. Assim, cresceu integrando naturalmente nas suas jornadas de criança e adolescente a oração, o desporto, o estudo e a caridade.

Ambos, Pier Giorgio e Carlo, cultivaram o amor a Deus e aos irmãos através de meios simples, ao alcance de todos: a Santa Missa diária, a oração, especialmente a Adoração Eucarística. Carlo dizia: «Diante do sol, bronzeamos. Diante da Eucaristia, torna-se santo!», e ainda: «A tristeza é o olhar voltado para si mesmo, a felicidade é o olhar voltado para Deus. A conversão nada mais é do que desviar o olhar de baixo para cima, basta um simples movimento dos olhos». Outra coisa essencial para eles era a Confissão frequente. Carlo escreveu: «A única coisa que devemos realmente temer é o pecado»; e admirava-se porque – são sempre palavras suas – «os homens se preocupam tanto com a beleza do próprio corpo e não se preocupam com a beleza da própria alma». Ambos, finalmente, tinham uma grande devoção pelos santos e pela Virgem Maria, e praticavam generosamente a caridade. Pier Giorgio dizia: «Em torno dos pobres e dos doentes, vejo uma luz que nós não temos». [3] Definia a caridade como «o fundamento da nossa religião» e, tal como Carlo, praticava-a sobretudo através de pequenos gestos concretos, muitas vezes ocultos, vivendo aquela que o Papa Francisco chamou de «a santidade “ao pé da porta”» (Exort. ap. Gaudete et exsultate, 7).

Quando a doença os atingiu e ceifou as suas jovens vidas, nem mesmo isso os impediu de amar, de se oferecerem a Deus, de bendizê-Lo e de orar por si próprios e por todos. Um dia, Pier Giorgio disse: «O dia da morte será o dia mais bonito da minha vida»; [4] e na última foto, que o retrata a escalar uma montanha do Val di Lanzo, com o rosto voltado para o objetivo, ele escreveu: «Para cima». [5] Além disso, ainda mais jovem, Carlo gostava de dizer que o Céu nos espera desde sempre, e que amar o amanhã é dar hoje o melhor de nós mesmos.

Queridos, os santos Pier Giorgio Frassati e Carlo Acutis são um convite dirigido a todos nós – especialmente aos jovens – a não desperdiçar a vida, mas a orientá-la para cima e a fazer dela uma obra-prima. Eles encorajam-nos com as suas palavras: «Não eu, mas Deus», dizia Carlo. E Pier Giorgio: «Se tiveres Deus no centro de todas as tuas ações, então chegarás até ao fim». Esta é a fórmula simples, mas vencedora, da sua santidade. E é também o testemunho que somos chamados a seguir, para saborear a vida até ao fim e ir ao encontro do Senhor na festa do Céu.


[1]  Lenda dos três companheiros, cap. I: Fontes Franciscanas, 1401.

[2]  Confissões, II, 10,18.

[3] Nicola Gori, Al prezzo della vita: “L’Osservatore romano”, 11 de fevereiro de 2021.

[4] Irene Funghi, I giovani assieme a Frassati: un compagno nei nostri cammini tortuosi: “Avvenire”, 2 de agosto de 2025.

[5] Ibid.

Leão XIV: por intercessão de Acutis e Frassati, pedir o dom da fé a crianças e jovens

“Que setembro seja um mês de oração pelas crianças e jovens que voltam às aulas e por aqueles que cuidam da sua educação. Peçam por eles, pela intercessão dos Beatos, e em breve Santos, Pier Giorgio Frassati e Carlo Acutis, o dom de uma fé profunda em seu caminho de amadurecimento”, disse Leão XIV durante a saudação aos fiéis de língua polonesa na Audiência Geral. A canonização dos futuros santos está marcada para domingo, 7 de setembro.
O Papa Leão XIV, na Audiência Geral desta quarta-feira (03/09), de volta à Praça São Pedro, refletiu sobre a humanidade de Cristo nos últimos momentos antes da sua morte, quando na cruz ele diz ter sede e lhe é oferecida uma esponja embebida em vinagre. “Na sede de Cristo podemos reconhecer toda a nossa sede”, disse o Pontífice, “não há nada de mais humano, nada de mais divino, do que saber dizer: eu preciso”. A sede do Senhor na cruz, recordou o Pontífice durante as saudações aos peregrinos vindos de diferentes partes do mundo, como do Brasil e de Portugal, ensina que pedir não é indigno, mas libertador:

“Saúdo cordialmente os fiéis de língua portuguesa, de modo especial os grupos vindos de Portugal e do Brasil. Jamais devemos nos envergonhar de pedir: todos nós temos necessidade do Senhor e da sua graça. Peçamos a Ele a água viva que sacia a nossa sede de Deus. Deus os abençoe!”Entregar a fraqueza a Deus sem vergonha

Aprender “a arte de pedir sem vergonha e de oferecer sem cálculo”, também foi enaltecido pelo Papa ao se dirigir aos fiéis de língua francesa, em especial, os provenientes de Luxemburgo e da França: “assim construiremos relações fraternas, verdadeiras e autênticas, portadoras de uma alegria que o mundo não conhece”, acrescentou o Pontífice. Aos peregrinos de língua áraba, Leão XIV reforçou:

“O cristão é chamado a entregar a sua fraqueza a Deus sem vergonha nem medo, porque só Ele é capaz de transformá-la numa ponte que conduz ao céu.”

Por intercessão dos futuros santos, Acutis e Frassati

Quando o Papa se dirigiu aos fiéis de língua polonesa, recordou que, passadas as férias de verão, o período é para retomar o ano escolar na Europa. Em véspera de duas importantes canonizações no próximo domingo, 7 de setembro, no Vaticano, Leão XIV também disse para pedir a intercessão dos futuros santos, os italianos Carlo Acutis e Pior Giorgio Frassati, o dom da fé. São dois jovens, que faleceram aos 15 e 24 anos respectivamente, que seguiam os valores do Evangelho e até hoje inspiram as famílias e irradiam a luz de Jesus a todos:

“Que setembro seja um mês de oração pelas crianças e jovens que voltam às aulas e por aqueles que cuidam da sua educação. Peçam por eles, pela intercessão dos Beatos, e em breve Santos, Pier Giorgio Frassati e Carlo Acutis, o dom de uma fé profunda em seu caminho de amadurecimento.”

Pier Giorgio Frassati e os papas.

Desde o Papa Paulo VI até o Papa Francisco, e agora o Papa Leão XIV, os Papas têm olhado para a vida do Bem-aventurado Pier Giorgio Frassati e visto mais do que apenas uma biografia inspiradora. Eles reconheceram nele um retrato vivo da santidade — uma santidade que não é reservada a poucos extraordinários, mas possível para cada um de nós.

O Papa Paulo VI o chamou de jovem de “frescor interior” cuja força vinha da comunhão com Deus. São João Paulo II o saudou como “o homem das oito bem-aventuranças”, um título que captura como Pier Giorgio fez do Evangelho seu plano de vida pessoal. O Papa Bento XVI o apresentou como modelo para os jovens, exortando-os a imitar sua coragem em dar testemunho da fé.

O Papa Francisco frequentemente repete o desafio de Frassati de “viver, e não apenas sobreviver”, e o Papa Leão XIV lembrou recentemente à Igreja que “ninguém nasce santo” — a santidade é forjada, como foi para Pier Giorgio, nas pequenas escolhas da vida diária.

Quando os Papas falam de Pier Giorgio, eles não estão apenas homenageando um jovem santo do passado. Eles estão apontando um caminho que também podemos trilhar. A santidade, nos dizem, não consiste em escapar do mundo, mas em engajá-lo com alegria, oração e amor abnegado. Pier Giorgio escalou montanhas, riu com amigos, serviu os pobres e defendeu a verdade. Ao fazer isso, mostrou que os altos da santidade estão ao alcance de quem estiver disposto a dar um passo fiel de cada vez.

Sua vida é um espelho no qual podemos ver o santo que somos chamados a nos tornar. Os Papas o viram. Agora, é a nossa vez de acreditar.

Papa Paulo VI sobre Pier Giorgio Frassati

Como ex-assistente da FUCI e próximo à família Frassati, Paulo VI teve um papel fundamental em retomar a causa de santidade de Pier Giorgio. No 7º aniversário da morte de Pier Giorgio (3 de julho de 1932), Montini refletiu:

“Como ainda podemos ser cristãos? Pier Giorgio responde com a vida… Ele era forte porque era austero. Austero e doce e vivo… da comunhão com Deus… frescor interior…”

São João Paulo II sobre Pier Giorgio Frassati

João Paulo II tinha uma admiração duradoura por Pier Giorgio, antes mesmo de se tornar Papa:

Como Cardeal, ele chamou famosamente Pier Giorgio de “Aqui está o homem das oito bem-aventuranças!”

Na beatificação de Pier Giorgio, em 20 de maio de 1990, ele ecoou esse sentimento:

“Pelo seu exemplo, ele proclama que uma vida vivida no Espírito de Cristo, o Espírito das Bem-aventuranças, é ‘bem-aventurada’…”

Ele também o descreveu como:

“o Homem das Oito Bem-aventuranças” e até mesmo “o homem do nosso século”, destacando seu amor e caridade como um farol em uma era turbulenta.

Falando aos jovens (em 5 de abril de 2001 em Roma):

“Sua existência como um jovem ‘normal’ mostra que se pode ser santo vivendo intensamente a amizade, o estudo, o esporte, o serviço aos pobres, em constante relação com Deus.”

Bento XVI sobre Pier Giorgio Frassati

Bento XVI frequentemente citava Pier Giorgio como exemplo poderoso para os jovens:

Na Audiência Geral de 5 de julho de 2006, disse:

“Que seu exemplo de fidelidade a Cristo inspire em vocês, queridos jovens, resoluções de corajoso testemunho evangélico.”

Em 4 de julho de 2007, acrescentou:

“Que seu exemplo os fortaleça… no testemunho do Evangelho em toda circunstância da vida… ofereçam os sofrimentos diários… apoiem vocês, queridos recém-casados, na construção de suas famílias…”

Em maio de 2010, descreveu Pier Giorgio assim:

“Jovem como vocês, viveu sua formação cristã com grande compromisso… testemunho de fé, simplicidade e eficácia… descubram que vale a pena se comprometer por Deus… mesmo quando isso é custoso.”

Papa Francisco sobre Pier Giorgio Frassati

O Papa Francisco tem citado Pier Giorgio em várias ocasiões:

Na sua Carta para a JMJ 2016, citou palavras do próprio Frassati (de uma carta de 1925):

“Viver sem fé, sem herança a defender, sem sustentar a verdade em contínua luta, não é viver, mas mal viver. Nunca devemos mal viver, mas viver.”

Em uma Audiência Geral de 13 de junho de 2018:

“O Bem-aventurado Pier Giorgio Frassati, que era jovem, costumava dizer que é preciso viver, e não apenas sobreviver…”

Em 2020, durante a entrega da Cruz da JMJ:

“Um jovem como vocês… disse isto: ‘Quero viver, e não apenas sobreviver.’”

Em 2022, ele incluiu Pier Giorgio entre exemplos de santidade juvenil:

Pier Giorgio exemplifica como se pode ser “um jovem, responsável, crível na fé, um crente feliz, sorridente” — um modelo para os jovens.

E durante uma saudação em junho de 2024:

Relembrando como Pier Giorgio auxiliou os pobres em Turim, Francisco disse:

“Ele não se perdeu na ‘boa vida’… nele havia amor por Jesus e pelos irmãos.”

Papa Leão XIV sobre Pier Giorgio Frassati

Ao preparar a canonização de Frassati, o Papa Leão XIV refletiu, durante a homilia da Missa pelo Jubileu do Esporte (15 de junho de 2025):

“Sua vida simples e luminosa nos lembra que, assim como ninguém nasce campeão, também ninguém nasce santo.”

Como modelo vivo para os jovens, o Papa Leão XIV exortou-os durante a Missa de Encerramento do Jubileu da Juventude (03 de agosto de 2025):

“Aspirem a grandes coisas, onde quer que estejam. Não se contentem com menos.”
Ele os encorajou a olhar além de buscas superficiais e enfatizou que a verdadeira realização está naquilo que acolhemos e compartilhamos com alegria, e não no que acumulamos. Nisso, ele destacou Frassati — junto com Carlo Acutis — como exemplo por sua dedicação à caridade, humildade e alegria cristã autêntica.

Fonte: frassatiphilippines.org

SANTA MISSA PARA A PASSAGEM DA CRUZ DA JMJ

HOMILIA DO PAPA FRANCISCO

Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo
Basílica de São Pedro, Altar da Cátedra
Domingo, 22 de novembro de 2020


A página que acabamos de ouvir é a última do evangelho de Mateus antes da Paixão: antes de nos dar o seu amor na cruz, Jesus transmite-nos as últimas vontades. Diz-nos que o bem que fizermos a um dos seus irmãos mais pequeninos – esfomeados, sedentos, forasteiros, necessitados, doentes, reclusos – será feito a Ele (cf. Mt 25, 37-40). Deste modo o Senhor entrega-nos a lista das prendas que deseja para as núpcias eternas connosco no Céu. São as obras de misericórdia que tornam eterna a nossa vida. Cada um de nós pode interrogar-se: Coloco-as em prática? Faço alguma coisa por quem tem necessidade, ou pratico o bem somente para as pessoas queridas e os amigos? Ajudo alguém que não me pode restituir? Sou amigo duma pessoa pobre? E podíamos continuar com tantas outras perguntas, postas a nós mesmos. «Eu estou ali – diz-te Jesus – espero por ti ali, onde não imaginas e para onde talvez nem quererias olhar: ali… nos pobres». Eu estou ali, onde não vê qualquer interesse o pensamento dominante, segundo o qual a vida vai bem, se for bem para mim. Eu estou ali: diz Jesus também a ti, jovem que procuras realizar os sonhos da vida.

Eu estou ali: disse Jesus, séculos atrás, a um jovem soldado. Era um jovem de dezoito anos, ainda não batizado. Um dia viu um pobre que pedia ajuda às pessoas, sem a obter, porque «todos passavam adiante». E aquele jovem, «vendo que os outros não se sentiam movidos à compaixão, compreendeu que aquele pobre estava reservado para ele». Mas não tinha nada consigo, apenas o seu uniforme de serviço. Então cortou o seu manto e deu metade ao pobre, suportando o riso escarninho de alguns ao redor. Na noite seguinte, teve um sonho: viu Jesus, vestido com a parte do manto com que envolvera o pobre. E ouviu-O dizer: «Martinho cobriu-me com este manto» (cf. Sulpício Severo, Vita Martini, III). São Martinho era um jovem que teve aquele sonho porque o vivera, embora sem o saber, como os justos do Evangelho de hoje.

Queridos jovens, queridos irmãos e irmãs, não renunciemos aos grandes sonhos. Não nos contentemos em fazer apenas o que é devido. O Senhor não quer que restrinjamos os horizontes, não nos quer estacionados nas margens da vida, mas correndo para metas altas, com júbilo e ousadia. Não fomos feitos para sonhar os feriados ou o fim de semana, mas para realizar os sonhos de Deus neste mundo. Ele tornou-nos capazes de sonhar, para abraçar a beleza da vida. E as obras de misericórdia são as obras mais belas da vida. As obras de misericórdia centram-se diretamente nos nossos sonhos grandes. Se tens sonhos de verdadeira glória – não da glória passageira do mundo, mas da glória de Deus –, esta é a estrada. Lê a passagem do evangelho de hoje, reflete nela. Porque as obras de misericórdia dão mais glória a Deus do que qualquer outra coisa. Ouvi isto com atenção: as obras de misericórdia dão mais glória a Deus do que qualquer outra coisa. No fim, é sobre as obras de misericórdia que seremos julgados.

Mas, donde se começa para realizar grandes sonhos? Das opções grandes. Hoje, o Evangelho também nos fala disto. Com efeito, no momento do juízo final, o Senhor baseia-Se nas nossas escolhas. Quase parece que não julga: separa as ovelhas dos cabritos, mas ser bom ou mau depende de nós. Ele limita-Se a tirar as consequências das nossas escolhas, trá-las à luz e respeita-as. Assim a vida é o tempo das escolhas vigorosas, decisivas e eternas. Escolhas banais levam a uma vida banal; escolhas grandes tornam grande a vida. De facto, tornamo-nos naquilo que escolhemos, tanto no bem como no mal. Se escolhemos roubar, tornamo-nos ladrões; se escolhemos pensar em nós mesmos, tornamo-nos egoístas; se escolhemos odiar, tornamo-nos rancorosos; se escolhemos passar horas no telemóvel, tornamo-nos dependentes. Mas, se escolhermos Deus, vamo-nos tornando dia a dia mais amáveis e, se optarmos por amar, tornamo-nos felizes. É assim, porque a beleza das opções depende do amor: não o esqueçais! Jesus sabe que, se vivermos fechados e na indiferença, ficamos paralisados; mas, se nos gastarmos pelos outros, tornamo-nos livres. O Senhor da vida quer-nos cheios de vida e dá-nos o segredo da vida: só a possuímos, se a dermos. Esta é uma regra de vida: a vida só a possuímos – agora e eternamente –, se a dermos.

É verdade que existem obstáculos que tornam difícil escolher: com frequência, são o medo, a insegurança, os porquês sem resposta… tantos porquês. Contudo o amor pede para os ultrapassar, não ficar agarrados aos porquês da vida, esperando que chegue do Céu uma resposta. A resposta chegou: é o olhar do Pai que nos ama e nos enviou o Filho. O amor impele a passar dos porquês ao para quem: do porque vivo, ao para quem vivo; do porquê me acontece isto, ao para quem posso fazer bem. Para quem? Não só para mim; a vida já está cheia de escolhas que fazemos para nós mesmos: ter um diploma, amigos, uma casa; satisfazer os nossos próprios interesses, os nossos passatempos. De facto, corremos o risco de passar anos a pensar em nós mesmos, sem começar a amar. Manzoni deu um bom conselho: «Devia-se pensar mais em fazer bem do que em estar bem; e acabaríamos assim por estar melhor» (I Promessi Sposi, cap. 38).

Mas não temos apenas as dúvidas e os porquês a insidiar as escolhas grandes, generosas; existem muitos outros obstáculos, todos os dias. Há a febre de consumir, que narcotiza o coração com coisas supérfluas. Há a obsessão pelo divertimento, que parece a única via para escapar dos problemas, quando, ao invés, é apenas um adiamento do problema. Há a fixação nos próprios direitos a reivindicar, esquecendo o dever de ajudar. E, depois, há a grande ilusão do amor, que parece algo a ser vivido ao som de emoções, quando amar é principalmente dom, escolha e sacrifício. Sobretudo hoje, escolher é não se fazer domesticar pela homogeneização, é não se deixar anestesiar pelos mecanismos do consumo, que desativam a originalidade, é saber renunciar às aparências e à exibição. Escolher a vida é lutar contra a mentalidade do usa-e-bota-fora e do tudo-e-imediatamente, para orientar a existência rumo à meta do Céu, rumo aos sonhos de Deus. Escolher a vida é viver, e nós nascemos para viver, não para vegetar. Disse-o um jovem como vós [o Beato Pier Giorgio Frassati]: «Eu quero viver, não vegetar».

Todos os dias se apresentam muitas opções no coração. Gostaria de vos dar um último conselho para vos treinardes a escolher bem. Se olharmos dentro de nós, veremos que muitas vezes surgem aí duas perguntas diferentes. A primeira: o que me apetece fazer? É uma pergunta que engana frequentemente, porque insinua que o importante é pensar em si mesmo e satisfazer todos os desejos e impulsos que me vêm. Mas a pergunta que o Espírito Santo sugere ao coração é outra: não aquilo que te apetece, mas aquilo que te faz bem. A opção diária situa-se aqui: escolher entre o que me apetece fazer e o que me faz bem. Desta busca interior, podem nascer escolhas banais ou escolhas vitais. Depende de nós. Olhemos para Jesus, peçamos-Lhe a coragem de escolher o que nos faz bem, de caminhar atrás d’Ele pela via do amor. E encontrar a alegria. Para viver, e não para vegetar.


Alocução do Santo Padre no termo da Eucaristia

No final desta celebração eucarística, saúdo cordialmente a todos vós aqui presentes e quantos nos acompanham através dos meios de comunicação social. Dirijo uma saudação particular a vós jovens, jovens panamenses e portugueses, aqui representados por duas delegações que, em breve, realizarão o gesto significativo da passagem da Cruz e do Ícone de Maria Salus Populi Romani, símbolos das Jornadas Mundiais da Juventude. É um passo importante na peregrinação que nos levará a Lisboa, em 2023.

E enquanto nos preparamos para a próxima edição intercontinental da JMJ, gostaria de relançar também a sua celebração nas Igrejas locais. Passados trinta e cinco anos da instituição da JMJ, depois de ter ouvido o parecer de várias pessoas e o Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, que é competente no que se refere à pastoral juvenil, decidi transferir, a partir do próximo ano, a celebração diocesana da JMJ do Domingo de Ramos para o Domingo de Cristo Rei. No centro, continua a estar o Mistério de Jesus Cristo Redentor do homem, como sempre destacou São João Paulo II, iniciador e patrono da JMJ.

Queridos jovens, gritai com a vossa vida que Cristo vive, que Cristo reina, que Cristo é o Senhor! Se vos calardes, garanto-vos que gritarão as pedras! (cf. Lc 19, 40).

PAPA FRANCISCO

AUDIÊNCIA GERAL

Praça São Pedro
Quarta-feira, 20 de novembro de 2024

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O texto a seguir inclui também as partes não lidas que são igualmente consideradas como pronunciadas:
  

Ciclo de Catequese. O Espírito e a Esposa. O Espírito Santo conduz o povo de Deus ao encontro de Jesus, nossa esperança. 14. Os dons da Esposa. Os carismas, dons do Espírito para o bem comum

Prezados irmãos e irmãs, bom dia!

Nas últimas três catequeses discorremos sobre a obra salvífica do Espírito Santo, que se atua nos sacramentos, na oração e seguindo o exemplo da Mãe de Deus. Mas ouçamos o que diz um famoso texto do Vaticano II: «O Espírito Santo não só santifica e conduz o Povo de Deus por meio dos sacramentos e ministérios, adornando-o com virtudes, mas [também] “distribuindo a cada um os seus dons como lhe apraz” (cf. 1 Cor 12, 11)» (Lumen gentium, 12). Também nós dispomos de dons pessoais que o mesmo Espírito concede a cada um de nós.

Por isso, chegou o momento de falar inclusive deste segundo modo de agir do Espírito Santo, que é a ação carismática. Uma palavra um pouco difícil, que explicarei. Dois elementos contribuem para definir em que consiste o carisma. Primeiro, o carisma é o dom oferecido “para o bem comum” (1 Cor 12, 7), a fim de ser útil a todos. Em síntese, não se destina principal e habitualmente à santificação da pessoa, mas ao serviço da comunidade (cf. 1 Pd 4, 10). Este é o primeiro aspeto. Segundo, o carisma é o dom concedido “a um”, ou “a alguns” em particular, não a todos do mesmo modo, e é isto que o distingue da graça salvífica, das virtudes teologais e dos sacramentos que, ao contrário, são iguais e comuns a todos. O carisma é concedido a uma pessoa ou a uma comunidade específica. Trata-se de um dom que Deus te oferece.

O Concílio explica-nos também isto. O Espírito Santo – diz – «distribui também graças especiais entre os fiéis de todas as classes, tornando-os aptos e dispostos a empreender diversas obras e encargos, proveitosos para a renovação e cada vez mais ampla edificação da Igreja, segundo aquelas palavras: A cada qual… se concede a manifestação do Espírito, em ordem ao bem comum» (1 Cor 12, 7).

Os carismas são as “joias”, ou ornamentos, que o Espírito Santo distribui para tornar bela a Esposa de Cristo. Assim, compreende-se porque o texto conciliar termina com a seguinte exortação: «E estes carismas, quer sejam os mais elevados, quer também os mais simples e comuns, devem ser recebidos com ação de graças e consolação, por serem muito acomodados e úteis às necessidades da Igreja» (Lumen gentium, 12).

Bento XVI afirmou: «Quem olha para a história da época pós-conciliar pode reconhecer a dinâmica da verdadeira renovação, que muitas vezes assumiu formas inesperadas em movimentos cheios de vida, tornando quase tangível a inesgotável vivacidade da santa Igreja». E este é o carisma concedido a um grupo, através de uma pessoa.

Devemos redescobrir os carismas, porque isto faz com que a promoção dos leigos e em particular das mulheres seja entendida não apenas como dado institucional e sociológico, mas na sua dimensão bíblica e espiritual. Os leigos não são os últimos, não, os leigos não são uma espécie de colaboradores externos, nem “tropas auxiliares” do clero, não! Têm carismas e dons próprios, com os quais contribuir para a missão da Igreja.

Acrescentemos outro aspeto: quando se fala de carismas, é preciso dissipar imediatamente um equívoco: o de os identificar com dons e capacidades espetaculares e extraordinários; ao contrário, são dons ordinários – cada um de nós tem o seu carisma – que adquirem valor extraordinário quando se inspiram no Espírito Santo e se encarnam nas situações da vida com amor. Esta interpretação do carisma é importante, porque muitos cristãos, ouvindo falar dos carismas, sentem tristeza ou desilusão, pois estão convencidos de não os possuir e sentem-se excluídos, ou cristãos de segunda classe. Não, não há cristãos de segunda classe, não, cada um tem o seu carisma pessoal e até comunitário. A eles já Santo Agostinho respondia, no seu tempo, com uma comparação deveras eloquente: «Se amares – dizia ao seu povo – o que possuis, não é pouco. Com efeito, se amares a unidade, tudo o que nela existe é possuído por alguém, e também tu o possuis! Somente o olho, no corpo, tem a faculdade de ver; mas é porventura só por si mesmo que o olho vê? Não, ele vê pela mão, pelo pé e por todos os membros» (Santo Agostinho, Tratados sobre João, 32.8).

Eis desvendado o segredo pelo qual a caridade é definida pelo Apóstolo como «o melhor caminho de todos» (1 Cor 12, 31): ela faz-me amar a Igreja, ou a comunidade em que vivo e, na unidade, todos os carismas, não só alguns, são “meus”, assim como os “meus” carismas, não obstante pareçam simples, são de todos e para o bem de todos. A caridade multiplica os carismas: faz com que o carisma de um, de uma única pessoa, seja o carisma de todos. Obrigado!

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Saudações:

Cordiais boas-vindas aos fiéis de língua portuguesa, de modo especial aos grupos de Fortaleza e de Garanhuns, no Brasil. Disponhamo-nos a colocar os carismas, que cada um de nós recebeu do Espírito, ao serviço de toda a comunidade. Assim viveremos a unidade na caridade. Deus vos abençoe!

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ANÚNCIO E APELO

Por ocasião do Dia Internacional dos direitos da infância e da adolescência, que se celebra hoje, gostaria de anunciar que o Encontro Mundial sobre os direitos das crianças, intitulado «Amemo-las e protejamo-las», terá lugar aqui no Vaticano a 3 de fevereiro, e contará com a participação de peritos e personalidades de vários países. Será a ocasião para identificar novas formas de socorrer e proteger milhões de crianças ainda sem direitos, que vivem em condições precárias, são exploradas e abusadas, e sofrem as consequências dramáticas das guerras.

Há um grupo de crianças que se prepara para este Dia, obrigado a todos vós que o fazeis. E aqui está uma menina corajosa que se aproxima… agora vêm todas! As crianças são assim, uma começa e depois vêm todas! Saudemos as crianças! Obrigado! Bom dia!

Quero dizer que no próximo ano, no Dia dos adolescentes, canonizarei o Beato Carlo Acutis, e na Jornada da Juventude, no próximo ano, canonizarei o Beato Pier Giorgio Frassati.

Ontem completaram-se mil dias desde a invasão da Ucrânia. Uma data trágica para as vítimas e para a destruição que causou, mas ao mesmo tempo uma tragédia vergonhosa para toda a humanidade! No entanto, isto não nos deve impedir de estar ao lado do martirizado povo ucraniano, nem de implorar a paz e de trabalhar para que as armas deem lugar ao diálogo e o conflito ao encontro.

Anteontem recebi uma carta de um jovem universitário da Ucrânia, que dizia: «Padre, quando na quarta-feira recordares o meu país e tiveres a oportunidade de falar ao mundo inteiro no milésimo dia desta terrível guerra, peço-te que não fales apenas dos nossos sofrimentos, mas que sejas também testemunha da nossa fé: embora seja imperfeita, o seu valor não diminui, pinta com pinceladas dolorosas o quadro de Cristo Ressuscitado. Nestes dias há demasiadas mortes na minha vida. É difícil viver numa cidade onde um míssil mata e fere dezenas de civis, ser testemunha de tantas lágrimas. Gostaria de fugir, gostaria de voltar a ser uma criança abraçada pela mãe, honestamente gostaria de estar em silêncio e no amor, mas dou graças a Deus porque, através desta dor, aprendo a amar mais. A dor não é só um caminho para a raiva e o desespero; se for baseada na fé, é uma boa mestra de amor. Padre, se a dor fere, significa que amas; por isso, quando falares da nossa dor, quando recordares os mil dias de sofrimento, lembra também os mil dias de amor, pois só o amor, a fé e a esperança dão verdadeiro sentido às feridas!». Assim escreveu este jovem universitário ucraniano.

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Resumo da catequese do Santo Padre:

Tratamos hoje de um modo de atuar do Espírito Santo na Igreja, que é a ação carismática. Dois elementos contribuem para definir “carisma”: é um dom concedido a alguns – não a todos – da comunidade; mas para a utilidade comum, para servir a toda a comunidade. Diferenciam-se, portanto, da graça santificante, das virtudes teologais e dos sacramentos que são idênticos e comuns a todos. São como “ornamentos” dados pelo Espírito à Esposa para torná-la ainda mais bela. A redescoberta dos carismas auxilia a compreender o papel dos leigos, e em particular da mulher, na Igreja, não com uma visão sociológica, mas na sua dimensão bíblica e espiritual. Os leigos não são “colaboradores externos” ou “auxiliares” do clero, mas possuem carismas próprios que contribuem com a missão da Igreja. Os carismas de cada um, postos ao serviço de todos, multiplicam-se pela caridade, que faz do carisma de um, o carisma de todos.


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PAPA FRANCISCO

ANGELUS

Praça São Pedro
Domingo, 24 de novembro de 2024

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Queridos irmãos e irmãs, bom domingo!

Hoje o Evangelho da liturgia (Jo 18, 33-37) apresenta-nos Jesus diante de Pôncio Pilatos: foi entregue ao procurador romano para ser condenado à morte. Entre os dois, porém – entre Jesus e Pilatos – inicia um breve diálogo. Através das perguntas de Pilatos e das respostas do Senhor, duas palavras em particular são transformadas, adquirindo um novo significado. Duas palavras: a palavra “rei” e a palavra “mundo”.

Num primeiro momento, Pilatos pergunta a Jesus: «És tu o rei dos Judeus?» (v. 33). Raciocinando como funcionário do império, quer perceber se o homem que tem diante de si constitui uma ameaça, e um rei para ele é a autoridade que governa todos os seus súbditos. Isso seria uma ameaça para ele, não é verdade? Jesus afirma ser rei, sim, mas de uma forma muito diferente! Jesus é rei porque é testemunha: é aquele que diz a verdade (cf. v. 37). O poder real de Jesus, o Verbo encarnado, reside na sua palavra verdadeira, na sua palavra eficaz, que transforma o mundo.

Mundo: eis o segundo momento. O “mundo” de Pôncio Pilatos é aquele em que o forte triunfa sobre o débil, o rico sobre o pobre, o violento sobre o manso, ou seja, um mundo que infelizmente conhecemos bem. Jesus é Rei, mas o seu reino não é daquele mundo, não é também deste mundo (v. 36). O mundo de Jesus é, de facto, o mundo novo, o mundo eterno, que Deus prepara para todos, dando a sua vida pela nossa salvação. É o reino dos céus, que Cristo traz à terra, derramando a graça e a verdade (cf. Jo 1, 17). O mundo, do qual Jesus é Rei, redime a criação arruinada pelo mal com a própria força do amor divino, Jesus salva a criação, porque Jesus liberta, Jesus perdoa, Jesus dá a paz e a justiça. “Mas isto é verdade, padre?” – “Sim”. Como está a tua alma? Há nela algo que a sobrecarrega? Alguma culpa antiga? Jesus perdoa sempre. Jesus nunca se cansa de perdoar. Este é o Reino de Jesus. Se há algo de mau dentro de ti, pede perdão. E Ele perdoa sempre.

Irmãos e irmãs, Jesus fala a Pilatos de muito perto, mas este permanece distante dele, pois vive num mundo diferente. Pilatos não se abre à verdade, apesar de a ter diante de si. Manda crucificar Jesus e ordena que se escreva na cruz: «Rei dos Judeus» (Jo 19, 19), mas sem compreender o significado destas palavras. “Rei dos Judeus”, daquelas palavras. No entanto, Cristo veio ao mundo, a este mundo: quem é da verdade, ouve a sua voz (cf. Jo 18, 37). É a voz do Rei do universo, que nos salva.

Irmãos e irmãs, a escuta do Senhor infunde luz ao nosso coração e à nossa vida. Por isso, procuremos perguntar-nos – cada um de nós pergunte-se no seu coração -: posso dizer que Jesus é o meu “rei”? Ou tenho outros “reis” no meu coração? Em que sentido? A sua Palavra é o meu guia, a minha certeza? Vejo n’Ele o rosto misericordioso de Deus que perdoa sempre, que está à espera para nos conceder o perdão?

Rezemos juntos a Maria, serva do Senhor, enquanto aguardamos com esperança o Reino de Deus.

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Depois de Angelus

Estes dois jovens coreanos receberam hoje a Cruz da Jornada da Juventude, que será em Seul, e levá-la-ão para a Coreia para se prepararem para a Jornada. Um aplauso aos coreanos! E também uma salva de palmas para os jovens portugueses que entregaram a Cruz.

Ontem, em Barcelona, foram beatificados o sacerdote Cayetano Clausellas Ballvé e o fiel leigo Antonio Tort Reixachs, mortos por ódio à fé em 1936, em Espanha. Damos graças a Deus pelo grande dom destas testemunhas exemplares de Cristo e do Evangelho. Aplaudamos os novos Beatos!

Hoje celebra-se nas Igrejas particulares a 39ª Jornada Mundial da Juventude, com o tema: Quem espera no Senhor caminha sem se cansar (cf. Is 40, 31). Também por vezes os jovens se cansam, se não esperam no Senhor! Saúdo as delegações de Portugal e da Coreia do Sul, que passaram o “testemunho” no caminho para a JMJ de Seul em 2027. Um aplauso às duas delegações.

Como já anunciei, no dia 27 de abril próximo, no contexto do Jubileu dos Adolescentes, proclamarei Santo o Beato Carlo Acutis. Além disso, tendo sido informado pelo Dicastério para as Causas dos Santos de que o processo de estudo da Causa do Beato Pier Giorgio Frassati está a chegar a uma conclusão positiva, tenciono canonizá-lo a 3 de agosto próximo, durante o Jubileu dos Jovens, depois de ter obtido o parecer dos Cardeais. Aplaudamos os próximos novos santos.

Amanhã, Myanmar celebra o Dia Nacional, em memória do primeiro protesto estudantil que colocou o país no caminho da independência, e na perspetiva de uma época pacífica e democrática que ainda está a lutar para se realizar. Expresso a minha proximidade a toda a população de Myanmar, em particular a quantos sofrem com os combates em curso, sobretudo os mais vulneráveis: crianças, idosos, doentes e refugiados, incluindo os Rohingya. Faço um apelo veemente a todas as partes envolvidas para que deponham as armas e encetem um diálogo sincero e inclusivo que possa garantir uma paz duradoura.

E saúdo calorosamente todos vós, romanos e peregrinos. Em particular, os grupos de fiéis provenientes de Malta, Israel, Eslovénia e Espanha, bem como das dioceses de Mostar-Duvno e Trebinje-Mrkan e do território da Abadia de Fossanova.

E continuemos a rezar pela martirizada Ucrânia, que tanto sofre, rezemos pela Palestina, por Israel, pelo Líbano, pelo Sudão. Peçamos a paz.

E a todos, a todos desejo bom domingo. Por favor, não vos esqueçais de rezar por mim. Bom almoço e até à vista!


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Visita Pastoral do Papa Francisco a Turim

ENCONTRO COM OS JOVENS

DISCURSO DO SANTO PADRE

Praça Vittorio
Domingo, 21 de Junho de 2015

[


Obrigado Chiara, Sara e Luigi. Obrigado porque as perguntas são sobre o tema das três palavras do Evangelho de João que acabámos de ouvir: amor, vida, amigos. Três palavras que no texto de João se cruzam, e uma explica a outra: não se pode falar da vida no Evangelho sem falar do amor — se falarmos da verdadeira vida — e não se pode falar do amor sem esta transformação de servos em amigos. E estas três palavras são tão importantes para a vida mas as três têm uma raiz comum: a vontade de viver. E aqui permito-me recordar as palavras do beato Pier Giorgio Frassati, um jovem como vós: «Viver, não ir vivendo!». Viver!

Sabeis que não é bom ver um jovem «parado», que vive, mas vive como — permiti-me a palavra — como um vegetal: faz as coisas, mas a vida não é uma vida que progride, está parada. Sabeis que a mim me causam tanta tristeza no coração os jovens que se aposentam aos vinte anos! Sim, envelheceram cedo… Por isso, quando Chiara fez aquela pergunta sobre o amor: aquilo que faz com que um jovem não se aposente é a vontade de amar, a vontade de dar o que o homem tem de mais belo, e que Deus tem de mais bonito, porque a definição que João dá de Deus é «Deus é amor». E quando o jovem ama, vive, cresce, não se aposenta. Cresce, cresce, cresce e dá.

Mas o que é o amor? «É a telenovela, padre? Aquilo que vemos nos romances televisivos?». Há quem pense que é esse o amor. Falar do amor é tão bom, podem-se dizer coisas agradáveis, muito bonitas. Mas o amor tem dois eixos sobre os quais se move, e se uma pessoa, um jovem não tem estes dois eixos, estas duas dimensões do amor, não é amor. Antes de tudo, o amor está mais nas obras do que nas palavras: o amor é concreto. Com a família salesiana, há duas horas, falei da tangibilidade da sua vocação… — E vejo que se sentem jovens porque estão aqui à frente! — O amor é tangível, consiste mais nas obras do que nas palavras. Não é amor dizer apenas: «Eu amo-te, eu amo todas as pessoas». Não. O que fazes por amor? O amor dá-se. Pensai que Deus começou a falar de amor quando estabeleceu uma história com o seu povo, quando escolheu o seu povo, fez uma aliança com o seu povo, salvou o seu povo, perdoou tantas vezes — quanta paciência tem Deus! Fez gestos de amor, obras de amor. E a segunda dimensão, o segundo eixo sobre o qual o amor se move é que o amor se comunica sempre, isto é, o amor ouve e responde, o amor faz-se no diálogo, na comunhão: comunica-se. O amor não é surdo nem mudo, comunica-se. Estas duas dimensões são muito úteis para compreender o que é o amor, que não é um sentimento romântico do momento nem uma história, não, é concreto, consiste nas obras. E comunica-se, ou seja, está no diálogo, sempre.

Portanto Chiara, respondo à tua pergunta: «Com frequência nos sentimos desiludidos precisamente no amor. Em que consiste a grandeza do amor de Jesus? Como podemos experimentar o seu amor?». E agora, eu sei que vós sois bons e permitireis que eu fale com sinceridade. Não pretendo ser moralista mas dizer uma palavra que não agrada, uma palavra impopular. Também o Papa algumas vezes deve arriscar sobre as coisas para dizer a verdade. O amor consiste nas obras, em comunicar, mas o amor é muito respeitador das pessoas, não as usa, isto é, o amor é casto. E a vós jovens deste mundo, deste mundo hedonista, neste mundo onde só o prazer é publicitado, passar bem, levar uma vida descontraída, eu digo-vos: sede castos, sede castos.

Todos nós na vida passámos por momentos nos quais esta virtude é muito difícil, mas é precisamente a vida de um amor genuíno, de um amor que sabe dar a vida, que não procura usar o outro para o próprio prazer. É um amor que considera a vida da outra pessoa sagrada: eu respeito-te, eu não quero usar-te, não quero usar-te. Não é fácil. Todos sabemos as dificuldades para superar este conceito «facilitador» e hedonista do amor. Perdoai-me se digo uma coisa que não esperáveis, mas peço-vos: fazei o esforço de viver o amor castamente.

E disto obtemos uma consequência: se o amor é respeitador, se o amor está nas obras, se o amor está em comunicar, o amor sacrifica-se pelos outros. Olhai para o amor dos pais, de tantas mães, de tantos pais que de manhã chegam ao lugar de trabalho cansados porque não dormiram bem para cuidar do próprio filho doente, isto é amor! Isto é respeito. Isto é viver bem. Isto é — passemos à outra palavra-chave — «serviço». O amor é serviço. É servir os outros. Quando Jesus, depois do lava-pés, explicou o gesto aos Apóstolos, ensinou que somos feitos para servir uns aos outros, e se digo que amo e não sirvo o outro, não o ajudo, não o faço progredir, não me sacrifico pelo outro, isto não é amor. Carregastes [a Cruz das jmj]: nela está o sinal do amor. Aquela história de amor de Deus misturada com as obras e o diálogo, com o respeito, o perdão e a paciência durante tantos séculos de história com o seu povo, acaba ali: o seu Filho na cruz, o serviço maior, que é dar a vida, sacrificar-se, ajudar os outros. Não é fácil falar de amor, não é fácil viver o amor. Mas com o que disse na minha resposta, Chiara, penso que te ajudei em algo, nas perguntas que me fizeste. Não sei, espero que te sejam úteis.

Obrigado Sara, apaixonada pelo teatro. Obrigada. «Penso nas palavras de Jesus: Dar a vida». Falemos disto agora. «Muitas vezes respiramos um sentido de desconfiança na vida». Sim, porque há situações que nos fazem reflectir: «Mas, vale a pena viver assim? O que podemos esperar desta vida?». Pensemos, deste modo, nas guerras. Algumas vezes disse que nós estamos a viver a terceira guerra mundial, mas aos pedaços. Aos bocados: na Europa há guerra, na África há guerra, no Médio Oriente há guerra, noutros países há guerra… Mas posso ter confiança numa vida assim? Posso fiar-me dos líderes mundiais? Eu, quando vou votar num candidato, posso confiar que não levará o meu país à guerra? Se confiares unicamente nos homens, perdes-te! Um aspecto faz-me reflectir: pessoas, dirigentes, empresários que se proclamam cristãos, mas fabricam armas! Isto desanima um pouco: dizem ser cristãos! «Não, não padre, eu não fabrico armas, não… Tenho apenas as minhas poupanças, os meus investimentos nas fábricas de armas». Ah! E porquê? «Porque os juros são um pouco mais altos…». E também as duas faces da moeda corrente, hoje: dizer uma coisa e fazer outra. A hipocrisia… Mas vejamos o que aconteceu no século passado: em 1914, mais exactamente em 1915. Houve aquela grande tragédia da Arménia. Muitos morreram. Não sei o número: sem dúvida mais de um milhão. Mas onde estavam as grandes potências de então? Olhavam para o outro lado. Porquê? Porque estavam interessadas na guerra: a sua guerra! E quantos morrem, são pessoas, seres humanos de segunda classe. Depois, nos anos 1930/40, a tragédia do Holocausto. As grandes potências tinham as fotografias dos caminhos-de-ferro que levavam os comboios aos campos de concentração, como Auschwitz, para matar os judeus, e também os cristãos, os roms, os homossexuais, para os matar ali. Mas diz-me, por que não bombardearam aqueles lugares? O interesse! E pouco depois, quase em contemporâneo, havia os lagers na Rússia: Stalin… Quantos cristãos sofreram, foram assassinados! As grandes potências dividiam entre si a Europa como se fosse um bolo. Tiveram que passar muitos anos antes de chegar a uma «certa» liberdade. Há aquela hipocrisia de falar de paz e fabricar armas, e até vender armas a quem entrou em guerra com outro, e àquele que está em guerra com este!

Entendo o que dizer acerca da desconfiança na vida; também hoje que estamos a viver na cultura do descartável. Porque se descarta o que não é útil economicamente. Descartam-se as crianças, porque não se geram, ou porque se matam antes que nasçam; descartam-se os idosos, porque não servem e abandonam-se ali, a morrer, uma espécie de eutanásia camuflada, e não se ajudam a viver; e agora descartam-se os jovens: pensai naquele 40% de jovens, aqui, sem trabalho. É exactamente um descarte! Mas porquê? Porque no centro do sistema económico mundial não estão o homem e a mulher como Deus quer, mas o deus dinheiro. E faz-se tudo por dinheiro. Em espanhol há um lindo ditado que reza assim: «Por la plata baila el mono». Traduzo: «Pelo dinheiro até o macaco dança». E assim, com esta cultura do descartável, podemos ter confiança na vida? Com aquele sentido de desafio [que] se propaga, se alastra, se difunde? Um jovem que não pode estudar, que não tem trabalho, que tem vergonha por não se sentir digno por não ter um trabalho, por não ganhar a vida. Mas quantas vezes estes jovens acabam na dependência? Quantas vezes se suicidam? As estatísticas dos suicídios entre os jovens não se conhecem bem. Ou quantas vezes estes jovens vão lutar com os terroristas, pelo menos para fazer algo, por um ideal. Eu compreendo este desafio. E por isso Jesus nos dizia para não repor a nossa segurança na riqueza, nos poderes humanos, nos poderes deste mundo. Como posso ter confiança na vida? Como posso fazer, como posso viver uma vida que não destrua, que não seja uma vida de destruição, uma vida que não descarte as pessoas? Como posso viver uma vida que não me desiluda?

E passo a responder à pergunta de Luigi: ele falava de um projecto de partilha, ou seja, de ligação, de construção. Devemos dar continuidade aos nossos projectos de construção, e assim esta vida não desilude. Se te associares a um projecto de construção, de ajuda — pensemos nas crianças de rua, nos migrantes, em tantos que vivem em necessidade, e não para lhes dar de comer só um, dois dias, mas para os promover com a educação, com a unidade na alegria dos Oratórios e tantas coisas, mas realidades que edificam, então afasta-se, esmorece aquele sentido de desconfiança na vida. Que devo fazer por isto? Não se aposentar demasiado cedo: agir. Agir . E digo o seguinte: ir contracorrente. Ir contracorrente. Para vós, jovens, que viveis esta situação económica, também cultural, hedonista, consumista com os valores de «bolhas de sabão», com estes valores não se vai a lado algum. Fazer coisas construtivas, mesmo se são pequenas, mas que nos unam aos nossos ideais: é este o melhor antídoto contra a desconfiança da vida, contra esta cultura que te oferece apenas o prazer: estar bem, ter dinheiro e não pensar noutras coisas.

Obrigado pela pergunta. A ti, Luigi, em parte, respondi, ou não? Ir contracorrente, ou seja, ser corajoso e criativo, ser criativo. No Verão passado recebi, uma tarde — era Agosto… Roma estava deserta. Falei por telefone com um grupo de jovens e moças que faziam camping em várias cidades da Itália, e vieram-me visitar — disse-lhes que viessem — mas pobrezinhos, todos sujos, cansados… mas felizes! Porque tinham feito algo «contracorrente»!

Muitas vezes, a publicidade quer convencer-nos de que isto é bom, que aquilo é bom, e faz-nos acreditar que são «diamantes»; Mas, reparai, estão a vender-nos vidro! E nós devemos ir contra isto, não ser ingénuos. Não comprar imundície que nos querem fazer passar por diamantes.

E para terminar, gostaria de repetir a palavra de Pier Giorgio Frassati: se quiserdes fazer algo de bom na vida, vivei, não andeis vivendo. Vivei!

Mas vós sois inteligentes e certamente me direis: «Mas, o Santo Padre fala assim porque vive no Vaticano, tem tantos monsenhores ali que lhe fazem o trabalho, está tranquilo e não sabe o que é a vida de todos os dias…». Sim, há quem possa pensar assim. O segredo consiste em compreender bem onde se vive. Nesta terra — e disse isto também à Família salesiana — em finais do século xix a juventude crescia nas piores condições: a maçonaria estava no auge, até a Igreja nada podia fazer, havia o anticlericalismo, o satanismo… Era um dos momentos mais obscuros e um dos lugares mais tristes da história da Itália. Mas se quiserdes fazer um bom dever em casa, ide procurar quantos santos e santas nasceram naquele tempo! Porquê? Porque se aperceberam que tinham que contrastar aquela cultura, aquele modo de viver. A realidade, viver a realidade. E se esta realidade é vidro e não diamante, eu procuro a realidade contracorrente e faço a minha realidade, mas que seja serviço aos outros. Pensai nos vossos santos desta terra, no que fizeram!

E obrigado, muito obrigado! Sempre amor, vida, amigos. Mas estas palavras podem ser vividas unicamente em «saída»: saindo sempre para levar algo. Se ficardes parados nada fareis na vida e acabareis por arruiná-la.

Esqueci de vos dizer que agora entregarei o discurso escrito. Eu conhecia as vossas perguntas, e escrevi alguma coisa sobre as vossas perguntas; mas não é o que disse, isto veio-me do coração; e entrego ao encarregado o discurso, e tu dá-lo-ás a conhecer [entrega as folhas ao sacerdote encarregado da pastoral juvenil]. Muitos de vós são universitários, mas não penseis que a universidade é apenas estudar com o cérebro: ser universitário significa também sair, sair em serviço, sobretudo aos pobres! Obrigado.


Discurso preparado pelo Santo Padre:

Queridos jovens

Agradeço-vos este caloroso acolhimento! E obrigado pelas vossas perguntas, que nos levam ao âmago do Evangelho.

A primeira, sobre o amor, interroga-nos sobre o sentido profundo do amor de Deus, que nos foi oferecido pelo Senhor Jesus. Ele mostra-nos até onde chega o amor: até ao dom total de si mesmo, até dar a própria vida, como contemplamos no mistério do Sudário, quando nele reconhecemos o ícone do «maior amor». Mas este dom de nós mesmos não deve ser imaginado como um raro gesto heróico nem reservado para qualquer ocasião excepcional. Com efeito, poderíamos correr o risco de cantar o amor, de sonhar o amor, de aclamar o amor… sem nos deixarmos tocar nem envolver por ele! A grandeza do amor revela-se ao cuidar de quem necessita, com fidelidade e paciência; portanto, é grande no amor quem sabe tornar-se pequeno para os outros, como Jesus, que se fez servo. Amar significa estar próximo, tocar a carne de Cristo nos pobres e nos últimos, abrir à graça de Deus as necessidades, os apelos, as solicitudes das pessoas que nos circundam. Então o amor de Deus entra, transforma e torna grandes as coisas pequenas, torna-as sinal da sua presença. São João Bosco é o nosso mestre precisamente pela sua capacidade de amar e de educar a partir da proximidade, que ele vivia com os adolescentes e os jovens.

À luz desta transformação, fruto do amor, podemos responder à segunda pergunta, sobre a desconfiança na vida. A falta de emprego e de perspectivas para o futuro certamente contribui para impedir o próprio movimento da vida, colocando muitos na defensiva: pensar em si mesmo, gerir tempo e recursos em função do próprio bem, limitar os riscos de qualquer generosidade… São todos sintomas de uma vida reprimida, conservada a todo o custo e que, por fim, pode levar também à resignação e ao cinismo. Ao contrário, Jesus ensina-nos a percorrer o caminho inverso: «Quem quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas quem sacrificar a sua vida por amor de mim, salvá-la-á» (Lc 9, 24). Isso significa que não devemos esperar circunstâncias externas favoráveis para nos pôr em jogo, pelo contrário, só empregando a vida — cientes de a perder! — criamos para os outros e para nós as condições de uma confiança nova no futuro. E aqui o pensamento vai de modo espontâneo a um jovem que realmente empregou assim a sua vida, a ponto de se tornar um modelo de confiança e de audácia evangélica para as jovens gerações da Itália e do mundo: o beato Pier Giorgio Frassati. Um seu lema era: «Viver, não ir vivendo!». Este é o caminho para poder experimentar na plenitude a força e a alegria do Evangelho. Assim não só encontrareis novamente confiança no futuro, mas conseguireis gerar esperança entre os vossos amigos e nos ambientes nos quais viveis.

Uma grande paixão de Pier Giorgio Frassati era a amizade. E a vossa terceira pergunta era precisamente: como viver a amizade de forma aberta, capaz de transmitir a alegria do Evangelho? Soube que esta praça na qual nos encontramos, nas noites de sexta-feira e de sábado, é muito frequentada por jovens. Isso acontece em todas as nossas cidades e aldeias. Penso que também alguns de vós se encontram aqui ou noutras praças com os vossos amigos. E então faço-vos uma pergunta: — cada um pense e responda dentro de si mesmo — naqueles momentos quando estais em companhia, conseguis fazer «transparecer» a vossa amizade com Jesus nas atitudes, no modo de vos comportardes? Pensais vós alguma vez, também no tempo livre, na diversão, que sois pequenos ramos apegados à Videira que é Jesus? Garanto-vos que pensando com fé nesta realidade, sentireis correr em vós a «linfa» do Espírito Santo, e produzireis fruto, quase sem vos dar conta: sabereis ser corajosos, pacientes, humildes, capazes de compartilhar, mas também de vos diferenciar, de vos alegrar com quem jubila e de chorar com quantos choram, sabereis amar quem não vos ama, respondereis ao mal com o bem. E assim anunciareis o Evangelho!

Os Santos e as Santas de Turim ensinam-nos que cada renovação, inclusive da Igreja, passa através da nossa conversão pessoal, através da abertura de coração que acolhe e reconhece as surpresas de Deus, impulsionados pelo maior amor (cf. 2 Cor 5, 14), que nos torna amigos também das pessoas sós, sofredoras e marginalizadas.

Queridos jovens, juntamente com estes irmãos e irmãs maiores que são os Santos, na família da Igreja nós temos uma Mãe, não o esqueçamos! Faço votos a fim de que vos confieis a esta Mãe carinhosa, que indicou a presença do «maior amor» precisamente no meio dos jovens, numa festa de núpcias. Nossa Senhora «é a amiga sempre solícita para que não falte o vinho na nossa vida» (Exort. apost. Evangelii gaudium, 286). Rezemos para que não nos deixe faltar o vinho da alegria!

Obrigado a todos vós. Deus vos abençoe a todos. E, por favor, rezai por mim.


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As palavras de Montini a respeito de Pier Giorgio.*

«O que, então, nos diz o exemplo deste irmão Pier Giorgio Frassati? Nos diz que o cristianismo ainda é a força da verdadeira juventude. Nos diz que o cristianismo é forte, não na grandeza que fascina o mundo; mas ele é forte e vivo na humildade de suas virtudes interiores e severas: ele é forte quando é vivido com sacrifício. Ele é forte quando está enfermo da doença ressuscitante da cruz ».

Na paróquia de Crocetta, em Turim, em 3 de julho de 1932, Mons. Giovanni Battista Montini,  da Secretaria de Estado e assistente da Federação dos estudantes universitários católicos (Fuci), comemora o sétimo aniversário da morte de Pier Giorgio (4 de julho de 1925). Aqui Montini celebrou a missa em 19 de abril de 1927 para uma convenção de fucino. O motivo subjacente do discurso montinense – publicado pela «Rivista dei giovani» em setembro de 1932 – é o seguinte: «A figura de Pier Giorgio é um escudo contra uma das mais fortes e sutis tentações que influenciam a vida espiritual,a autêntica e completa vida cristã, ávida pela perfeição, representa agora uma concepção estreita e antiquada da existência humana, um ideal extinto, um mundo pequeno e fechado, um arcaísmo que só quem vive à beira do grande rio da atividade moderna pode fazer o seu próprio ».

A resposta de Frassati – continua Montini – é sua própria vida, a vida de um forte. A fantasia repete para ele o que ocorreu para São Luigi Gonzaga, quando para representar este santo ele escolheu a conhecida imagem presumida dos Veronese, onde em uma figura viril e gentil de um jovem parece refletir uma alma vigorosa e ousada. Antes de perceber que ele era uma alma santa,perceberam que era uma alma forte». E  cita o esplêndido elogio do secretário socialista Filippo Turati “Pier Giorgio Frassati era realmente um homem”.

Giovanni Battista Montini nasceu em Concesio (Brescia) em 26 de setembro de 1897, filho de Giorgio, figura eminente do movimento católico e deputado do Partido Popular italiano, e Giuditta Alghisi. Sacerdote desde 29 de maio de 1920, ingressou na Secretaria de Estado e foi assistente de Fuci, primeiro em Roma e depois em nível nacional. Por 9 anos tece amizade e consonância com dezenas de jovens. O singular é que Montini e Frassati não se conhecem, mas Montini prova ter muito clara a grande estatura: «É simples. O charme do complicado não dura ». Em 1932, ele diz: «Deus, segredo desta juventude admirável, que acreditou e amou-o como pai, como fonte de vida, como um dom inefável que expande a alma para as fronteiras do infinito, que a inebriação da maravilha e contentamento, torna silencioso em adoração e canção lírica e alegre, a  pureza casta e a onda de amor incomparável. Rico nessa força, Pier Giorgio é moderno e jovem. É por isso que toda a sua vida é dominada por uma firme consciência de renovação, de ação, de milícia. É por isso que um capítulo de sua vida é intitulado: “A alegria de viver”. O cristianismo é uma exaltação da vida real. É por isso que, do coração e das mãos de Pier Giorgio, irradia caridade contínua. A caridade do próximo é a manifestação da vida que melhor reflete a de Deus, sua paternidade universal, sua prodigalidade, sua bondade, sua essência. É a melhor prova que atesta a coincidência da religião com a vida. É um ato prático de fé que afirma ser Cristo em um irmão necessitado. E foi a suprema profissão cristã de Pier Giorgio: o último esforço. Ele nos diz como podemos olhar para o poder deslumbrante de nosso século sem medo e hostilidade, não por amaldiçoar as coisas, mas por nos dominarmos. Finalmente, ele nos diz que beleza, que força, que juventude brota na humilde presença de nossas associações, vivem a ideia que é anunciada para você. Ele nos diz que mesmo que gostemos de Pier Giorgio o uniforme “Mihi vivere Christus est”, temos, como ele, o caminho do futuro e o caminho da eternidade diante de nós “.

  • Futuro Papa PauloVI

Em homenagem ao dia do Papa.

Palavras de Pier Giorgio ao amigo Mario Bergonzi.”Eu gostaria de estar no seu lugar para ver o Santo Padre,você sabe como eu amo o Papa. Gostaria de fazer algo por ele, mas não podendo, rezo todos os dias para que Jesus lhe de muitas consolações e bençãos. E viva o Papa!”

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